Adolescência e… a importância da idade
Já Camille Flammarion assinalava a respeito de uma casa “mal-assombrada” por um garoto de 12 anos; “Neste, como na maior parte dos casos análogos, a causa desconhecida produtora dos fenômenos está associada a um organismo moço”.
Um dos fundadores da SPR, Frank Podmore, que inicialmente fora espírita e depois, com o estudo, passou a rejeitar tal interpretação, esforçou-se por apresentar em cada caso a explicação natural. Concretamente com referência aos fenômenos parafísicos, analisou cuidadosamente todas as centenas de casos de “poltergeist” recolhidos pela Sociedade nos primeiros 14 anos de fundação. Comprovou que todos os casos estavam relacionados com adolescentes, principalmente do sexo feminino. A tese de Podmore passou a ser conhecida humorística, ou um tanto sarcasticamente, como a “teoria da mocinha malcriada” (“naughty little girl theory”).
Schrenck-Notzing corrobora a conclusão com os casos de sua pequena coleção, independentemente dos pesquisadores da SPR:
– “No caso bem documentado e estabelecido por vias judiciais, o da casa mal-assombrada de Ylojarvi, uma empregada de 13 anos, Emma Lindroos, estava estreitamente relacionada com todas as manifestações. No mesmo instante em que ela abandonou a casa, cessaram repentinamente as telecinesias, aportes e ações maldosas.
– “Também na casa mal-assombrada de Dietersheim os fenômenos estavam ligados com a filha, de 9 anos, de uma empregada.
– “Johanna P., causante de processos parapsicológicos que a acompanharam de karnten a Braunau e Londres, no começo da assombração, 14 anos. No ano seguinte suas manifestações começaram a debilitar-se, até desaparece completamente. É provável que isto fosse pelo maior desenvolvimento tanto físico como psíquico, e também pelo desenvolvimento mais livre da vida sexual.
– “Eleonore Zugun, mocinha camponesa romena, tinha 14 anos quando (…) se constituiu em objeto de estudo (…) (é muito famosa em parapsicologia). Com sua menarquia (primeira menstruação) tardia, aos 15 anos, cessaram suas faculdades (…)
– “Repetiu-se o mesmo no caso de Anna Gronauer, de 15 anos, filha de um mineiro em Peissenberg – Alta Baviera. Com sua menarquia, relativamente tardia, acabaram os fenômenos (…)
– “Vilma Molnar, de 14 anos, era uma moça camponesa de Bergeland, levada em 1926 ao Castel de Schonau e a Viena para a observação dos fenômenos.
– “Therese Winklhofer é considerada agente de assombração na casa da Augustenstrasse de Munique. Essa histérica de 17 anos ‘funcionava’ somente na presença do estudante Ludwig..
Não há a mínima lógica em atribuir aos espíritos dos mortos ou aos demônios etc., tal preferência por adolescentes problemáticos.
Mas ninguém ignora que essa idade pode acarretar, principalmente para ao sexo feminino, problemas, tensões, agressividade… E conseqüentemente “poletrgeist”!
Também o metapsíquico Hereward Carrington, com a colaboração de Nandor Fodor, recolheu 375 casos de “poltergeist” que ele considerou os mais famosos na história da pesquisa desde o “poltergeist” de Bingen-am-Rheim, no ano de 355 (aportes de pedras, telecinesias inclusive desmantelando uma casa, tiptologia e psicofonias) até 1949 (dois anos antes da publicação do livro – embora Carrington tenha vivido até 1959 -). Submeteu-os a criteriosa crítica, e considerou fraudulentos 26 casos, e 29 duvidosos. Mesmo que todos estes casos duvidosos fossem fraudulentos, ficam 330 casos que Carrington considera irrefutavelmente autênticos. Para somar sua autoridade, transcrevo as palavras com que Frank Smyth formula uma das conclusões do livro de Carrington e Fodor:
“Característica de quase todos os ‘poltergeist’ é sua preferência por (…) adolescentes, acreditando-se que o início da puberdade pode ser um fator desencadeante deste tipo de perturbações”.
O prestigioso parapsicólogo alemão. Dr. Hans Bender, diretor do Instituto de Parapsicologia da Universidade de Friburgo na Brisgóvia, em nome de toda a parapsicologia moderna, pode garantir com certeza:
Antes de tudo se constata geralmente que estes fenômenos dependem de pessoas jovens, na idade da puberdade”.
As autoridades citadas deve-se incluir o inglês Dr. Owen, da Universidade de Cambridge, que publicou um livro imprescindível no estudo dos “poltergeist”. Owen analisou todos os casos recolhidos pelos pesquisadores da SPR, além dos numerosos casos colecionados por ele mesmo em amplo inquérito, e ainda muito casos de outros pesquisadores. De tão rica casuística, pode-se deduzir com segurança que se trata de força exteriorizada e dirigida com manifesta freqüência por uma adolescente e, num segundo lugar bem distanciado, por meninos na mesma idade crítica, sendo que os casos decorrentes de outras categorias de pessoas podem-se considerar pura exceção.
Com relação à sexualidade, é muito freqüente nas observações de “poltergeist” que se faça constar que a responsável é geralmente uma jovenzinha sexualmente reprimida. Outros falam também em senhoras na menopausa e sexualmente marginalizadas. Inclusive alguns elucubraram com a nascente sexualidade e os hormônios de meninas retardadas no aparecimento da puberdade e adolescência: não desabrochando no desenvolvimento corporal e psicológico, estourariam pelos fenômenos parafísicos.
Aporte moderno
O Dr. Cuenot, laureado da Academia de Medicina, relata para a Revista do Instituto Metapsíquico Internacional de Paris os aportes sofridos durante quatro meses (de meados de março até começo de setembro de 1963), na Clínica Ortopédica de sua propriedade, em Arcachon. O prestigioso parapsicólogo Robert Tocquet foi lá verificar e garante também os fatos.
Os doentes hospitalizados foram atormentados durante todo esse período com telecinesias e aportes de até trezentas pedras de diversos tamanhos. Várias testemunhas afirmaram ter visto cair entre 10 e 20 pedras ao seu redor. Uma testemunha contou 17 aportes em cinco minutos. Ás vezes eram pedrinhas muito pequenas, em algumas ocasiões alcançavam tamanho de meio tijolo. A trajetória e a velocidade dos disparos também foram muito diversos.
Não se sabia de onde caíam as pedras, pareciam claramente lançadas do alto. Freqüentemente caíam vertical, atravessando a folhagem das árvores. Várias testemunhas declararam que as pedras entraram (aporte) no banheiro, fechado. O Sr. T. André, agente de polícia parisiense, viu sair uma janela uma pedra de uns 250g. Verificou imediatamente que o quarto estava vazio e, como todos outros cômodos desocupados, fechado a chave. Outra noite, quatro hóspedes da clínica estavam no terraço quando recomeçaram os lançamentos das pedras, visivelmente procedendo do quarto andar do prédio. Subiram correndo. Estavam todos os quartos fechados a chave. Desceram de novo e de novo caiu uma chuva de pedras, agora procedente do segundo andar, que também estava (a porta geral do andar assim como de todas as dependências) fechado a chave.
Em uma tarde em que fazia muito bom tempo, reuniram-se todos os hóspedes, assim como todo o pessoal da clínica, no terraço. Não faltou ninguém à reunião. “Jamais foi lançada tal quantidade de pedras. Isso levou ao convencimento geral de que não se podia suspeitar de nenhum paciente, nem mesmo do pessoal”. Além do mais, que hábil prestidigitador teria lançado pedras dentro do banheiro, como testemunharam alguns hóspedes?
Regras do além?
Os aportes produziam-se a qualquer hora, mas principalmente no crepúsculo.
Como se os espíritos dos mortos fossem afetados pelo peso do dia e a proximidade da noite. A influência, porém, do cansaço foi observado entre os doentes nas enfermarias, clínicas e hospitais de todo o mundo.
As pedras constituíam uma ameaça, manifestamente expressavam revolta, mas como sempre “jamais foi ferido nenhum doente, e só dois deles, foram tocados muito ligeiramente”. Palavras textuais do Dr. Cuenot.
Com respeito aos “ataques satânicos” (ou de “espíritos pouco desenvolvidos” segundo os Kardecistas!), Görres já observava que paradoxalmente as pedras não atingem as pessoas (só o próprio doente).
O mesmo paradoxo aparece nos clássicos “endemoninhados” (?) do cemitério de São Medardo.
Ora, a conhecida lei da física, “forças do mesmo sinal se repelem, tem analogia na parapsicologia, aplicada à telergia que conduz os objetos. Na interpretação espírita, porém, um “perispírito” rejeita outro “perispírito”? Isso prova que o “perispírito de um defunto não age sobre o “perispírito” de um vivo…
Destaca o Dr. Cuenot: “A única condição suficiente para que se desencadeasse o fenômeno era a presença, por perto, de Jacqueline R., de 17 anos”. O Dr. Cuenot submeteu Jacqueline a um interrogatório psicológico. Conclui assim que a adolescente estava desenganada da vida, não gostava de namoro, não queria ter filhos, ria e sentia-se consolada quando presenciava enterros, chorava desiludida quando assistia a qualquer casamento… só gostava de chamar à atenção e de que se ocupassem dela. Por que tudo isso? Até 11 anos fora uma menina psicologicamente normal. O desespero, a revolta, o ódio surgiram com a primeira menstruação, fenômeno que a traumatizou e de que jamais falara com ninguém. Com a descarga pelas confidências dela e pela explicações do médico, Jacqueline R. se acalmou e os fenômenos cessaram.
“Regras” dos espíritos dos mortos?
O psiquiatra A. Assailly deduz das coleções de casos de poltergeist que nos poucos casos que não se deve ao início da sexualidade, costuma ver no ambiente senhoras no climatério.
Ou será a menopausa dos “desencarnados”?
Inferioridade
“Coisas de crianças”
Os “poltergeist” ou “casas mal-assombradas”, com seus fenômenos físicos de todo tipo, estão quase sempre ligados à adolescência; e sempre a pessoas problemáticas, reprimidas. Às vezes, estão ligados a pessoas mentalmente retardadas. Por isso geralmente nas casas mal-assombradas aparece claramente essa psicologia infantil, retardada ou problemática.
Foi precisamente a constatação dessa realidade uma das principais causas pelas que Flammarion abandonou as interpretações espíritas. Escreve:
É fácil compreender a grande importância teórica desses fatos (…), a primeira impressão que nos causam esses fenômenos é a de sua banalidade e vulgaridade (…) Exercícios bem singulares! Forças inteligentes em ação, mas inteligências bem medíocres (…) Esses exercícios físicos, extravagantes e incompreensíveis, são sempre idênticos em toda parte (…) O que mais nos impressiona, nesses eventos, é as vezes (…) Podemos afirmar a realidade dos fatos, e confessamos que eles são absurdos, idiotas, inexpressivos, assemelhando-se a traquinadas de garotos astuciosos (…) Sapatos que saltam e mudam de posição? Deslocamento de móveis? Pancadas? Não mais que vulgaridade”.
** Os responsáveis pelos fenômenos de efeitos físicos costumam estar presos à vida instintiva desordenada e não se deixam guiar pela razão e pelos critérios superiores. Às vezes estão presos a fortes paixões, a depressões profundas.
Detalhes muito significativos
O caso de “poltergeist” que mais impressionou o Dr. Owen, foi de Sauchie (Escócia). Não que apresentasse fenômenos especiais ou em maior intensidade. Atrever-me-ia a dizer inclusive que estava abaixo da média. Mas foi o único a que Owen teve acesso “direto” através de uma gravação magnetofônica! (Se viesse ao Brasil…! Ao CLAP quase diariamente chegam pedidos de ajuda).
Foi em meados de dezembro de 1960 que o Dr. Owen viajou a Sauchie para recolher informações sobre os fenômenos que começaram em 22 de novembro e que praticamente terminaram em 1º de dezembro. A BBC difundira o caso, tendo seus repórteres constatado pessoalmente alguns fenômenos. Entre numerosas testemunhas, devem-se destacar os médicos Drs. W. H. Nisbet e William Logan e sua esposa Sheila, médica conceituada.
Tudo começou por uma tiptologia forte, um “barulho fragoroso” provindo do quarto onde Vírginia Campbell, de 11 anos, com sua prima, se dispunha a dormir. Os outros primos (maiores de idade) e os tios verificaram – verificaram-no depois freqüentemente – que tudo se tranqüilizou quando Virgínia, por fim, relaxou e caiu no sono. No dia seguinte viram uma mesinha levantar-se no ar quase dois decímetros durante uns segundos, perto de Virgínia, sem que ela a tocasse.
O pároco anglicano de Sauchie, Rev. T. W. Lund, foi chamado pela família à meia-noite, e constatou também as violentas tiptologias nas paredes, nos móveis etc., sem que deixassem marcas. Um baú certas noites abria e fechava sozinho, deslocava-se no ar, disparava. O Reverendo viu os movimentos e pequenos vôos a meio metro de altura realizados pelo baú cheio de roupa. Na noite seguinte, o Reverendo Lund e mais dois pastores – que trouxera consigo – benziam a casa… As tiptologías acompanharam os serviços e foram aumentando gradativamente de intensidade até se tornarem realmente violentas.
Na escola primária, professora e alunos viram que a tampa da escrivaninha abria e fechava sozinha várias vezes. Quando a professora se aproximou, levantou-se no ar, inteira, uma escrivaninha que o aluno vizinho, apavorado, deixara momentaneamente desocupada. Outro dia, a pesada mesa da professora deslizou quando Virgínia estendia os braços naquela direção. Depois, uma varinha, que a professora tinha sobre a mesa, começou a vibrar e foi deslizando até chegar ao extremo da mesa e cair; então a própria mesa começou a vibrar e a girar.
As tiptologias – o fenômeno mais freqüente neste caso – numa tarde foram tão fortes que inclusive os vizinhos ouviram. Foram precisamente esses estrondos, gravados pela BBC, que impressionaram o Dr. Owen.
Observaram-se também outras telecinesias: travesseiros girando 90 graus e ondulando ao longo da sua superfície como se alguém fosse correndo a mão em pressão sobre eles.
Praticamente a isso se reduzem os fenômenos do “poltergeist” de Sauchie. Mas é muito interessante para nós agora pelos abundantes detalhes psicológicos e patógenos que muito acertadamente o Dr. Owen soube recolher:
1. Até esse ano, a vida de Virgínia, caçula de pais idosos, fora excessivamente isolada: vivera no campo, na Irlanda. Os pais passaram a ficar o dia todo e todos os dias trabalhando. Os irmãos, adultos, em outra cidade. Ela, sem mais companhia que o cachorrinho Toby, ao qual se agarrava com exagerado carinho; e eventualmente uma amiguinha da sua idade, Ana, a quem também se afeiçoou profundamente. Nos seus transes (“estados alterados de consciência”: perda de consciência e afloramento do inconsciente) no período de “poltergeist”, como também em falas durante os sonhos, Virgínia não chamava pelos pais, parentes, professores ou médico, não apelava aos sentimentos religiosos: reclamava desesperadamente por Ana e especialmente por seu cachorrinho Toby.
2. No começo de 1960, Virgínia, com a mãe – o pai ficou na Irlanda por problemas de trabalho -, viajou à Escócia para morar na casa de uns tios e primos. Ao ser matriculada na escola primária, o diretor fez constar a estranha impressão que lhe causara: Virgínia, como também a mãe, “davam a impressão de pessoas que tivessem vivido sempre num lugar longínquo e isolado, a realidade transformando-se para elas numa mistura dos seus contornos imediatos e das ilimitadas fantasias do seu pensamento”. Virgínia era muito tímida e sua professora encontrou dificuldades, no começo, para se comunicar com ela. Virgínia enfrentou obstáculos para se comunicar com os colegas, também por causa da diferença de dialeto.
3. O diretor da escola fez constar também que Virgínia nos testes de inteligência demonstrou ser claramente superdotada – Q.I 111, apesar da evidente inibição -, como também demonstrou superioridade à média nos testes de destreza manual, docilidade etc.
4. A mãe – continua o diretor da escola – “não deu mais informações do que as estritamente solicitadas, sua voz parecia sair, a contragosto, de um rosto firme como uma máscara”. Mulher seca, fria, dura…
5. Virgínia tinha 11 anos. “É muito alta para sua idade (…) Atualmente está atravessando um período de rapidíssimo desenvolvimento físico e maturação. A puberdade, no seu sentido concreto (menstruação) não se apresentou ainda, mas ela está caminhando rapidissimamente para isso”.
6. Durante os transes “demonstrava ausência das normais inibições, como se seus pensamentos (ou instinto sexual) reprimidos (pela severíssima educação materna) estivessem emergindo (…). Registra-se notável quantidade de garrulices histéricas de Virgínia, nas quais aparecia a mesma falta de inibição que caracterizava seu transe”.
7. “No período do poltergeist, ela apresentava claríssimos sintomas de distúrbios mentais e emotivos” até então latentes e depois de novo contornados.
8. Algum tempo depois de acalmada a situação – em meados de janeiro de 1961 – “Virgínia aceitou tranqüilamente” o fato de ela ter passado por aqueles fenômenos de poltergeist, inclusive tirou deles um certo senso de orgulho, batizando-os como ‘Wee Hughie'” (o pequeno Huguinho).
Pais idosos, solidão desabrochando rapidamente na sexualidade, educação severamente repressiva, tímida e “caipira”, repentinamente Virgínia, superdotada, tem de enfrentar a cidade e a escola em pais diferente. Nestas circunstâncias alguém poderá duvidar de que tem lógica, embora patológica, que Virgínia sinta saudades do cachorrinho e da amiguinha perdidos, estoure em “poltergeist” e depois se vanglorie da popularidade compensadora assim alcançada? Alguém poderia duvidar de que a telergia é dirigida inconscientemente pela própria Virgínia? Alguém poderia não ver o absurdo que seria atribuir este caso aos espíritos dos mortos, demônios, ou…?
Betsy Bell, um drama clássico
Muitos livros de parapsicologia estudam este caso. Richard William Bell tinha seis anos na época em que começaram os problemas em sua família e muitos anos depois escreveria um livro, “Our Family Trouble”, logicamente com várias e evidentes distorções em suas lembranças. O núcleo, porém, é muito claro.
John Bell, com sua esposa Luce e seus nove filhos, vivia numa grande fazenda no Condado de Robertson, no estado de Tennesse, EUA. Betsy tinha doze anos quando começou o poltergeist, e 16 quando terminou em tragédia com a morte do fazendeiro. Inicialmente se tratava de tiptologias tipo arranhadelas, que logo se converteram em pancadas cada vez mais fortes e “inexplicáveis”. Com o passar do tempo começaram as telecinesias tipo cadeiras e louças pelo chão de toda a casa, e aportes em forma de chuva de pedras e paus.
Os dois escritores Bell destacavam nos seus livros que os fenômenos giravam com destacada e indiscutível preferência ao redor de Betsy…
Quando os fenômenos começaram a ser agressivos, o casal compreendeu que não poderia continuar mantendo o problema em segredo, e que precisava de ajuda. Poderia ser meramente uma espécie de pesadelo quando os pequenos Richard William e Joel acordaram aos prantos e gritos dizendo que alguém lhes puxara os cabelos, mas Elisabeth (Betsy) certamente se sentiu atormentada por várias horas durante aquela noite.
Acudiram então ao pároco, pastor James Johnson, que logo atribuiu os fenômenos aos demônios, apesar de as psicofonias serem muito piedosas, pois repetiam os sermões do próprio Johnson e de outro pastor seu colega! O pastor recitou sobre a família os macabros exorcismos.
O efeito da sugestão foi aparentemente benéfico só por pouco tempo, porque a tensão se acumulou e estourou precisamente pela macabra sugestão demonológica: logo as psicofonias, em vez de sermões, repetiam grandes blasfêmias; e Betsy explodiu em violenta auto-sugestão. Dizia receber violentos tabefes. Ninguém via a mão agressora, mas todos viam aparecer imediatamente marcas vermelhas no seu rosto (dermografia). E viam os violentos e contínuos puxões de cabelos que faziam-na rolar pelo chão em contorção de dor. Betsy entrava em transes ou desmaios que duravam até meia hora. Acordava em meio a psicofonias tipo assobios estridentes e vozes ininteligíveis.
Após o fracasso dos exorcismos, passaram a atribuir os fenômenos ao espírito de uma bruxa falecida. O pastor Johnson primeiro, depois numerosos vizinhos, vieram fazer consulta à bruxa, e obtinham respostas por meio das tiptologias nas paredes, e de psicofonias rudimentares, sons como de estalidos com a língua. Um médico, para certificar-se de que as psicofonias não eram hábeis truques de ventriloquia, tampava a boca de Betsy com as mãos. As psicofonias continuavam.
Análise psicopatológica
Neste caso pioneiro (1817 a 1821) e famoso, os pesquisadores modernos logo, é claro, garantem que não eram demônios nem o espírito da bruxa, senão, como sempre, o inconsciente de Betsy, quem dirigia a sua própria telergia.
Muitas das psicofonias expressavam os sentimentos de Betsy:
Com referência ao pai, as psicofonias – e outros fenômenos – manifestavam um ódio feroz, prometiam atormentá-lo o mais possível e por todo o resto da sua vida. Havia motivo…
À mãe mostravam todo o carinho que a própria Betsy sempre manifestava.
Com respeito aos irmãos Joel, Richard e Drewry manifestavam essa ambivalência freqüente entre os irmãos: as psicofonias os insultavam, ameaçavam, e voavam pedras e paus vindos “do nada”, mas nunca lhes causaram ferimento (o leitor, lembrará que a telergia de uma pessoa não pode agir sobre outras pessoas, a não ser de raspão ou de ricochete). Os outros irmãos, dada a diferença de idade, pouco se relacionavam com Betsy, e os fenômenos praticamente os ignoravam. Simples relacionamento, também sem emotividade, com os vizinhos.
Com referência a si mesma, Betsy mostrava a divisão da sua personalidade. Refiro-me agora ao rompimento com o noivo. Sob o véu de ameaças, na realidade se defendia a si mesma.
Quando Betsy tinha entre 13 e 14 anos, namorava um vizinho, Joshua Gardner. As vozes constantemente sussurravam: “Por favor, Betsy Bell, não aceite Joshua”, “suplico-lhe, não se case com Joshua”…, e choviam ameaças de uma vida de tormentos se não atendesse os conselhos das psicofonias. Assim todos aceitaram o rompimento.
Para o fazendeiro, os fenômenos e as ameaças psicofônicas da filha terminaram tragicamente:
A angústia, a superstição, o medo, os remorsos – tinha motivos para isso! – arruinaram sua saúde, que quatro anos antes parecia inquebrantável. Sentia fortes cãimbras nos maxilares, a boca intumescida, a língua se inchou de tal modo que no fim não podia nem ingerir alimentos nem falar. Os tiques nervosos começaram ao redor da boca, estendendo-se depois a todo o corpo. Tinha transes e convulsões que duravam até quinze dias. Por vários meses foi vítima de delírio, obrigado a permanecer de cama. Num dia do outono de 1820, John Bell reagiu contra a prostração, levantou-se da cama e saiu a inspecionar a fazenda. Subitamente cambaleou, caiu prostrado, e os filhos viram espantados como “o rosto se contorcia de um modo horroroso”, enquanto seus sapatos saíam dos pés e voavam longe, para repetir a mesma operação sempre que um dos filhos tentava calçá-lo. A cena era acompanhada por psicofonias “em zombaría de nós” e “gritos demoníacos”. O pai teve de ficar de cama de novo. Um mês mais tarde, em 19 de dezembro, foi encontrado em profundo sopor, do qual morreu. Ao lado, o vidro onde o remédio receitado pelo médico fora substituído por “uma beberagem escura”. O médico fez com que o gato engolisse a beberagem, e o animal morreu em poucos minutos.
Suicídio? Pouco provável, dada a invalidez do fazendeiro. Poderia ser um assassinato inculpável e inconsciente numa das freqüentes trocas de personalidade de Betsy, que assim plasmou e levou até as últimas conseqüências seu ódio ao pai.
Quando o médico chegou para lavrar o atestado de óbito, o inconsciente de Betsy – secundus, “a bruxa” – disse pela psicofonia:
“Não perca tempo com o velho, desta vez agarrei-o bem, não mais levantará”. No dia seguinte, quando o cadáver do fazendeiro descia à sepultura, a psicofonia permitiu-se o acidente de entoar uma canção de bêbados…
Tudo indica que o agudo sentimento de culpa de John Bell e o ódio que a filha sentia tinham desencadeado a cisão da personalidade de Betsy e de seu pai.
Betsy era sexualmente precoce. Seu ambiente familiar era extremamente fechado de critérios. O pai, hipocritamente puritano.
Muito acertadamente o psicanalista Nando Fodor chama a atenção para a coincidência do início de “poltergeist” com o despertar sexual de Betsy e as primeiras manifestações do complexo de culpa do pai. Fodor, no seu livro, The Story of the Poltergeist, acena para a possibilidade de John ter violentado a própria filha. O incesto naquela época e naquelas fazendas não era tão raro.
A psicologia também explica que a Segunda Personalidade de Betsy, ao mesmo tempo em que se revolta contra o pai, também esbofeteia a si mesma na personalidade oficial, pelo duplo motivo de repreensão moralista de má filha e autodesprezo pela experiência brutal sofrida. Também por esta experiência traumática rejeitou o namorado.
Descarregada a tensão nervosa com a morte do pai, e aliviada com a separação do namorado, Betsy não precisou mais de emissões telérgicas, e os fenômenos cessaram.
Nem demônios nem espírito da bruxa. Basta uma simples análise dos fatos para perceber que quem dirige a telergia é o inconsciente problemático dos vivos.